27 de julho de 2025

Ai de ti, Manaíra!

 

Não sei bem, mas há dias que nos sentimos como aqueles poetas nostálgicos, perdidos e embriagados pela saudade. E por mais que tentemos ser fortes, ela continua lá, beliscando nosso coração e trazendo de volta, aquilo que o tempo nunca mais irá nos devolver.

Toda saudade é nomeada. Sentimos falta de pessoas, animais, épocas e lugares. É por isso, que escrevo: a praia de Manaíra é a minha saudade. Levo-a comigo latente e viva na memória. Posso visitar Miami Beach, praia da Ponta Negra, Copacabana, praia do Futuro, Boa Viagem, Pipa e outras mais badaladas. No entanto, é Manaíra que me envolve e, me faz reviver a felicidade efêmera.

Ai de ti, Manaíra! Com seus coqueiros doadores de sombras, suas calçadas impregnadas de calor, refúgio de seus transeuntes. Será que eles sentem a mesma saudade que sinto? Talvez não, porque essa nostalgia que acalento foi dada exatamente por ti.

Beijada pela praia do Bessa e abraçada por Tambaú. Manaíra é testemunha das juras de amor entre os namorados, dos sonhos que ali foram idealizados, das noites estreladas, quase infinitas.

Recordo-me de ti, porque você mora em mim. Assim como o horizonte se entrega ao teu mar esverdeado. Penso em ti, porque a maresia que sopras, para sempre irá desgrenhar meus cabelos no fim de tarde. Escrevo sobre ti, porque foram as tuas espumantes ondas, que brindaram minha alegria.

De todas foste a eleita. Tua beleza reluz na simplicidade que te enriquece. Nas ruas que me levaram a ti. Nas madrugadas que te enamorei em silêncio. Ai de ti, Manaíra! Nem mesmo os prédios da João Maurício, foram capazes de reter, o casamento entre o céu e o mar.

No mais, apenas memórias me fazem te sentir outra vez. Tu és livre para desaguar em qualquer coração. Tu és profunda e a minha vida é momentânea e rasa. Mesmo distante a milhas de ti, trago nos pés, a chama da tua areia, nos lábios, o sabor do teu sal. E no olhar, o pôr do sol a derreter os homens e navios.

 

 

 

 

 

22 de junho de 2025

Paraquedas

 

E quando teu

Salto for para

A solidão.

Abra o seu...

Para

 Q

 U

 E

 D

 A

 S

1 de junho de 2025

O beija-flor

 


                                                                                                                     

A floricultura ficava perto do prédio. Era só dobrar duas esquinas, para encontrar o lugar com sua diversidade de flores e rosas. Mamãe  se encantou com o ambiente, apaixonou-se na íntegra, pelas criaturas perfumadas. Não tardou muito e ela começou a  chegar todos os dias, com uma planta diferente.

 Em vasos de porcelana ou de plástico, lá estava ela cultivando aqueles pequenos seres aromáticos. Na cozinha, os alecrins perfilados disputavam o espaço com o pote de açúcar. Enquanto que na sala, a  mesinha central  de vidro recebia um esbelto arranjo de peônia. Nem mesmo o banheiro era isento da nova flama de mamãe. Sobre a pia, um buquê de jacinto parecia uma pintura, diante do azulejo esbranquiçado.

Papai ressabiado com os eventos botânicos, mostrava-se avesso a tudo que era natural. E sisudo, dizia não ser correto, gastar tanto dinheiro com flores. Mamãe pouco dava ouvidos às suas contestações. Atribuía à florista, toda a oferta floral. A cada dia, os crisântemos, os lírios e os  eucaliptos. Além  de ingressarem constante no recinto familiar, também faziam florescer em mamãe, a mulher que há tempos, adormecia na infertilidade do amor matrimonial. A pele pálida de antes desapareceu. E um tom roseado rutilava amiúde, nas suas bochechas. Pouco a pouco, mamãe adubava suas pretensões, semeava a necessidade de brotar para o mundo.

Do seu coração fluía a seiva bruta, o líquido vital regava o terreno arenoso do amor. A floricultura era um refúgio, fomento da essência de mamãe. Das poucas vezes que estive lá, pude ver de como ela aspirava com estima, a fragrância oriunda dos cabelos claros da florista. Definitivamente, mamãe fincava suas raízes em novas terras.

No fim de 1983, deixei meus pais. No auge da primavera, retornei para visitá-los. Ao chegar em casa, deparei-me com Seu Florêncio inclinado sobre o parapeito da janela.  “Cheguei, pai! Cadê mamãe?” Desanimado, papai olhou-me e desviou sua atenção para a tarde infinitamente azul. Foi assim, que entendi, mamãe bateu asas para comprar flores e nunca mais voltou...

23 de maio de 2025

1º Sarau Literário da Biblioteca Pública de Manaus

No dia 20 de Maio, participei do "1º Sarau Literário da Biblioteca Pública de Manaus" onde houve a exposição dos poemas dos meus livros "Português Amoroso" Vol 1 e 2, e participei de uma roda de conversa com as turmas do primeiro ano do ensino médio de escolas públicas. Foi um momento emocionante e cheio de carinho entre os participantes. Agradeço novamente pelo convite!








18 de maio de 2025

A caneta da crônica

A caneta deitada, repousa sobre a mesa. Olho para ela, com o intuito de acordá-la. Seu sono é intenso, parece abençoado pelos anjos. Talvez, no dia de hoje, ela não queira sentir o calor dos meus dedos. No deserto do indizível, não inspiro poetas e cancelo minha vontade de conquistar palavras. Quisera eu escrever uma crônica, que a tornasse eterna. Redentora e perene, nas páginas dos livros. No entanto, não há romantismo na criação literária. Não tenho a maresia para soprar meus devaneios. Diante das minhas retinas, apenas o concreto, a poeira e a desistência de escrever.

A vida vai muito além do ego das palavras. Do lado de lá, tem a família, o caos e o trabalho que paga os boletos. Na verdade, o mundo não cabe numa crônica, mas a crônica, cabe em vários mundos. Por isso, testemunho o pôr do sol, sinto o cheiro dos últimos temporais, acerto os talos das mangas e disponho me ouvir em outras vozes.

A crônica cruza a margem do papel. Invisivelmente, ela se redige. Para algumas vezes, naufragar no silêncio ou no vazio que me preenche. Entre rascunhos, as pálpebras descem, mas há faróis que iluminam a solidão, de quem é hipnotizado pelas palavras.

Nessa vigília vocabular, insisto em querer escrever. Mas a caneta, no seu estado de hibernação, não me concede essa honra. Da folha em branco, as linhas horizontais simulam o universo que preciso criar. Contudo, há momentos, em que uma crônica não se exibe, não se verbaliza. A crônica, antes de ser, ela precisa existir: nas interrogações postas, nas exclamações contidas, nas vírgulas que pausam os sonhos.

Quem sabe, em algum momento, a caneta volte a despertar. E autônoma, escreva sobre mim — uma crônica, para regar minha aridez de lirismo. Sim, há uma crônica escondida, suspensa nos varais da imaginação. Há uma crônica, absurdamente ansiosa, para encontrar o seu autor.