A
floricultura ficava perto do prédio. Era só dobrar duas esquinas, para
encontrar o lugar com sua diversidade de flores e rosas. Mamãe se encantou com o ambiente, apaixonou-se na
íntegra, pelas criaturas perfumadas. Não tardou muito e ela começou a chegar todos os dias, com uma planta
diferente.
Em vasos de porcelana ou de plástico, lá
estava ela cultivando aqueles pequenos seres aromáticos. Na cozinha, os
alecrins perfilados disputavam o espaço com o pote de açúcar. Enquanto que na
sala, a mesinha central de vidro recebia um esbelto arranjo de
peônia. Nem mesmo o banheiro era isento da nova flama de mamãe. Sobre a pia, um
buquê de jacinto parecia uma pintura, diante do azulejo esbranquiçado.
Papai
ressabiado com os eventos botânicos, mostrava-se avesso a tudo que era natural.
E sisudo, dizia não ser correto, gastar tanto dinheiro com flores. Mamãe pouco
dava ouvidos às suas contestações. Atribuía à florista, toda a oferta floral. A
cada dia, os crisântemos, os lírios e os
eucaliptos. Além de ingressarem
constante no recinto familiar, também faziam florescer em mamãe, a mulher que
há tempos, adormecia na infertilidade do amor matrimonial. A pele pálida de
antes desapareceu. E um tom roseado rutilava amiúde, nas suas bochechas. Pouco
a pouco, mamãe adubava suas pretensões, semeava a necessidade de brotar para o
mundo.
Do
seu coração fluía a seiva bruta, o líquido vital regava o terreno arenoso do
amor. A floricultura era um refúgio, fomento da essência de mamãe. Das poucas
vezes que estive lá, pude ver de como ela aspirava com estima, a fragrância
oriunda dos cabelos claros da florista. Definitivamente, mamãe fincava suas
raízes em novas terras.
No
fim de 1983, deixei meus pais. No auge da primavera, retornei para visitá-los.
Ao chegar em casa, deparei-me com Seu Florêncio inclinado sobre o parapeito da
janela. “Cheguei, pai! Cadê mamãe?”
Desanimado, papai olhou-me e desviou sua atenção para a tarde infinitamente
azul. Foi assim, que entendi, mamãe bateu asas para comprar flores e nunca mais
voltou...
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